domingo, 26 de agosto de 2007

Useppe


La Storia de Elsa Morante.

Livro muito belo e muito triste. Romance comprometido, de matriz anarquista, que vê a História como uma sucessão de assassínios e todas as revoluções como embustes.

«La guerra è stata una commedia, a' mà! (...) La Storia, è una commedia loro, che ha da finí.» (442)

Useppe, o menino cuja história é seguida pelo romance, durante os seus seis anos de vida, é uma personagem inesquecível. Pequenino bodisatva, guardião da pureza e verdades do coração humano. Apaixonado pela mãe Ida, pelo irmão Nino, quinze anos mais velho e pela sua cadelinha Bella. Apaixonado por todos.

«Quell' essere minimo e disarmato non conosceva la paura, ma un'unica, spontanea confidenza. Sembrava che per lui non esistessero sconosciuti, ma solo gente sua di famiglia, di ritorno dopo qualche assenza, e che lui riconosceva a prima vista.» (186)

Me lo dài un bacetto?

domingo, 19 de agosto de 2007

Poema

Biglietto di Natale a M.L.S.

Maria Luisa quante volte
raccoglieremo questa nostra vita
nella pietà di un verso, come i Santi
nel loro palmo le città turrite?

La primavera quante volte
turbinerà i miei grani di tristezza
dentro le piogge, fino alle tue orme
sconsolate - a Saint Cloud, sulla Giudecca?

Non basterà tutto un Natale
a scambiarci le favole più miti:
le tuniche d'ortica, i sette mari,
la danza sulle spade.

«Mirabilmente il tempo si dispiega...»
ricondurrà nel tempo questo minimo
corso, una donna, un àtomo di fuoco:
noi che viviamo senza fine.

Ognissanti' 54

Cristina Campo

sábado, 18 de agosto de 2007

Explicação de Marsilio Ficino

Biblioteca Medicea Laurenziana (Florença)

«Marsilio Ficino nasceu em Figline, em 19 de Outubro de 1433 e morreu em Careggi, em 1 de Outubro de 1499. Após os estudos de Humanidades, cursa Medicina e Filosofia em Florença. Relacionado com o círculo dos Médicis (seu pai era o médico dessa poderosa família florentina), foi ao jovem humanista que Cosme confiou a orientação da Academia por ele fundada, em 1462, incumbindo-o da tarefa de restaurar e divulgar o pensamento de Platão.
(...) À luz da contemporânea exégese histórico-filosófica, o platonismo dos florentinos não serve de critério para apreciar o autêntico pensamento de Platão. É um platonismo profundamente determinado por preocupações teológicas ou mesmo místicas e marcado por uma feição estética. O que de modo algum põe em causa a sua legitimidade como uma das mais interessantes formas de renascimento da visão platónica do mundo e muito menos pode impedir de reconhecer a sua fecundidade especulativa e o seu papel na preparação do advento da moderna visão da natureza, do cosmos e da ciência, ocorrido (os grandes intervenientes nesse processo - Copérnico, Kelller, Galileu - tinham disso consciência) sob a tutela de Platão. (...)»



Leonel Ribeiro dos Santos, Linguagem, Retórica e Filosofia no Renascimento, Edições Colibri, pp. 250-255







segunda-feira, 13 de agosto de 2007

De profundis




T'avais les mains comm' des raquettes
Pépée
Et quand j'te f'sais les ongles
J'voyais des fleurs dans ta barbiche
T'avais les oreill's de Gainsbourg
Mais toi t'avais pas besoin d'scotch
Pour les r'plier la nuit
Tandis que lui... ben oui !
Pépée

T'avais les yeux comm' des lucarnes
Pépée
Comme on en voit dans l'port d'Anvers
Quand les marins ont l'âme verte
Et qu'il leur faut des yeux d'rechange
Pour regarder la nuit des autres
Comme on r'gardait un chimpanzé
Chez les Ferré
Pépée

T'avais le cœur comme un tambour
Pépée
De ceux qu'on voil' le vendredi saint
Vers les trois heures après midi
Pour regarder Jésus-machin
Souffler sur ses trent'-trois bougies
Tandis que toi t'en avais qu'huit
Le sept avril
De soixante-huit
Pépée

J'voudrais avoir les mains d'la mort
Pépée
Et puis les yeux et puis le cœur
Et m'en venir coucher chez toi
Ça chang'rait rien à mon décor
On couch' toujours avec des morts
On couch' toujours avec des morts
On couch' toujours avec des morts
Pépée

Léo Ferré




*




Avevi le mani come due racchette
Pepée
E quando ti tagliavo le unghie
Vedevo fiori sul tuo muso
Avevi le orecchie di Gainsbourg
Pero' alla sera andando a letto
Non le piegavi con lo scotch
Pepée

Due occhi simili a lanterne
Pépée
Quelle che splendono nei porti
Quando l'avere occhi di scorta
Farebbe gola ai marinai
Per osservar la notte altrui
Così come uno scimpanzé
Presso i Ferré
Pépée

Il tuo cuore come quei tamburi
Pépée
Che tacciono il venerdì santo
Verso le tre pomeridiane
Quando un Gesù spegne soffiando
Le sue trentatre candeline
E tu ne avevi solo otto
il sette aprile sessantotto
Pépée

Vorrei avere le mani della morte
Pepée
E poi gli occhi e poi il cuore
E poi coricarmi a casa tua
Non cambierebbe niente al mio scenario
Dormiamo sempre con i morti
Dormiamo sempre con i morti
Dormiamo sempre con i morti

(Traduzione M. Macario, adattata da R.M.)


sábado, 11 de agosto de 2007

Carta (1)

Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso.

É possível, porque tudo é possível, que ele seja

aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo,

onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém

de nada haver que não seja simples e natural.

Um mundo em que tudo seja permitido,

conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer,

o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós.

E é possível que não seja isto, nem sequer seja isto

o que vos interesse para viver. Tudo é possível,

ainda quando lutemos, como devemos lutar,

por quanto nos pareça a liberdade e a justiça,

ou mais que qualquer delas uma fiel

dedicação à honra de estar vivo.

Um dia sabereis que mais que a humanidade

não tem conta o número dos que pensaram assim,

amaram o seu semelhante no que ele tinha de único,

de insólito, de livre, de diferente,

e foram sacrificados, torturados, espancados,
e entregues hipocritamente à secular justiça,

para que os liquidasse com «suma piedade e sem efusão de sangue».

Por serem fiéis a um deus, a um pensamento,

a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas

à fome irrespondível que lhes roía as entranhas,

foram estripados, esfolados, queimados, gaseados,

e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido,

ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória.

Às vezes, por serem de uma raça, outras

por serem de uma classe, expiaram todos

os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência

de haver cometido. Mas também aconteceu e acontece que não foram mortos.

Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer,

aniquilando mansamente, delicadamente,

por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus.

Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror,

foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha

há mais de um século e que por violenta e injusta

ofendeu o coração de um pintor chamado Goya,

que tinha um coração muito grande, cheio de fúria

e de amor. Mas isto nada é, meus filhos.

Apenas um episódio, um episódio breve,

nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis)

de ferro e de suor e sangue e algum sémen

a caminho do mundo que vos sonho.

Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém

vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la.

É isto que mais importa - essa alegria.

Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto

não é senão essa alegria que vem

de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez

alguém está menos vivo ou sofre ou morre

para que um de vós resista um pouco mais

à morte que é de todos e virá.

Que tudo isto sabereis serenamente,

sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição,

e sobretudo sem desapego ou indiferença,

ardentemente espero. Tanto sangue,tanta dor, tanta angústia, um dia

- mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga -

não hão-de ser em vão. Confesso que

muitas vezes, pensando no horror de tantos séculos

de opressão e crueldade, hesito por momentos

e uma amargura me submerge inconsolável.

Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam,

quem ressuscita esses milhões, quem restitui

não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?

Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes

aquele instante que não viveram, aquele objecto

que não fruíram, aquele gesto

de amor, que fariam «amanhã»

E, por isso, o mesmo mundo que criemos

nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa

que não é só nossa, que nos é cedida

para a guardarmos respeitosamente

em memória do sangue que nos corre nas veias,

da nossa carne que foi outra, do amor que

outros não amaram porque lho roubaram.


JORGE DE SENA

domingo, 5 de agosto de 2007

Infância



Tonino Guerra, poeta italiano, argumentista de Fellini e Antonioni, romagnolo, profundamente ligado à cultura camponesa, feita de pobreza e simplicidade, disse uma vez estas palavras ao padre e poeta português José Tolentino de Mendonça:


«Sabe... um artista tem sempre os olhos na sua infância. Eu mantenho sempre que nós comemos a nossa infância... Se, por trinta anos, comi os 'involtini' da minha mãe isso é uma droga: são os 'involtini' melhores do mundo; tal como o 'spaghetti que comia às sextas-feiras; tal como o salame... Estamos ligados a coisas tão remotas.»



quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Lisboa (1)

"Eu chorava como um tolo pelas ruas com a delicadeza das pessoas".

Caetano Veloso, doutor em Filosofia, um dos maiores escritores brasileiros de canções conta a sua primeira visita a Lisboa nos anos 60.